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domingo, 19 de fevereiro de 2017

O que é o Sistema S, quanto custa e a quem beneficia

Por Bruno Lupion


Modelo começou a ser estruturado em 1942 para oferecer ensino, cultura e lazer; entidades são financiadas por dinheiro arrecadado pelo governo

Fachada do SENAI no Mato Grosso

Em 2016, a Receita Federal repassou R$ 16 bilhões arrecadados de tributos para nove entidades privadas do chamado Sistema S, como Sesi, Senac, Sesc e Sebrae. O valor equivale a cerca de metade do Orçamento do Bolsa Família de 2017. 

O volume expressivo de recursos por vezes atrai a atenção de gestores públicos e parlamentares, que
gostariam de utilizá-los em outras finalidades, mas enfrentam o lobby organizado da indústria, do comércio e do agronegócio, que controlam as entidades do sistema. 

O ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy tentou, em 2015, reter 30% dessas verbas para ajudar a fechar as contas do governo, sem sucesso. Em outubro de 2016, aproveitando o debate sobre reforma da Previdência, o senador Ataídes de Oliveira (PSDB-TO) apresentou um projeto de lei que destina 30% dos recursos do Sistema S à Seguridade Social, que inclui aposentadorias públicas, saúde e assistência social. 

Essas organizações são sustentadas com dinheiro arrecadado pelo governo, por meio de contribuições que as empresas são obrigadas a pagar sobre o valor da sua folha de pagamento, mas são entidades de direito privado. Por isso, são chamadas de “paraestatais”. 

As indústrias, por exemplo, recolhem 1% ao Senai, 1,5% ao Sesi, sobre a folha de pagamento. As empresas do comércio recolhem 1,5% ao Sesc. O dinheiro arrecadado pelo governo é distribuído integralmente para as entidades. 


O Sistema S começou a ser estruturado no país em 1942 para oferecer uma rede de ensino que melhorasse a produtividade da mão-de-obra e serviços culturais e de lazer com financiamento garantido, mas sem depender da gestão pública. Ele é composto por nove entidades: 

  • Sesi: Ligado à indústria, oferece opções culturais, de lazer e esporte 
  • Senai: Ligado à indústria, oferece cursos e assessoria técnica 
  • Sesc: Ligado ao comércio, oferece opções culturais, de lazer e esporte 
  • Senac: Ligado ao comércio, oferece cursos 
  • Sebrae: Ligado à micro e pequena empresa, oferece cursos e acesso a crédito 
  • Senar: Ligado ao agronegócio, oferece cursos 
  • Sescoop: Ligado às cooperativas, oferece cursos e assessorias ao setor 
  • Sest: Ligado ao setor dos transportes, oferece opções culturais, de lazer e esporte 
  • Senat: Ligado ao setor dos transportes, oferece cursos 

Fachada do SENAC em Caruaru-PE

Essas entidades têm representações nacionais que supervisionam as regionais nos Estados. Há diversas formas de escolha dos presidentes. Algumas delas são comandadas pelos presidentes das respectivas confederações (o Senai é presidido pelo presidente da Confederação Nacional da Indústria e o Senac, pelo presidente da Confederação Nacional do Comércio). 

No Sebrae, o presidente é eleito pelo conselho deliberativo, que conta com representantes das associações e de bancos públicos. Já o presidente do Conselho do Sesi é nomeado pelo presidente da República. 


A Receita Federal arrecadou e repassou, em 2016, R$ 16 bilhões para as nove entidades do Sistema S. Quem mais recebeu foi o Sesc, vinculado ao setor de comércio e serviços, com R$ 4,6 bilhões. Em seguida está o Sebrae, que oferece apoio à micro e pequena empresa, com R$ 3,1 bilhões. Confira a destinação por entidade:



VALORES



O Sistema S é voltado para os trabalhadores, mas em regra oferece cursos e oportunidades de lazer e cultura para qualquer um. 

Em 2015, o Senai, ligado à indústria, registrou 3,4 milhões de matrículas em diversos tipos de cursos de educação profissional e tecnológica. 

O Sesc, vinculado ao comércio, ofereceu 18,5 mil apresentações de teatro e 15,6 mil shows de música, segundo os relatórios de gestão das entidades. 



TRANSPARÊNCIA 

Por lidarem com recursos arrecadados pelo governo, as entidades do Sistema S são pressionadas a comprovarem a destinação das verbas e o atendimento do interesse público. 

Apenas a partir de 2013, a Lei de Diretrizes Orçamentárias, que estipula anualmente regras para o uso do dinheiro público, passou a obrigar essas entidades a divulgarem na internet o quanto receberam de contribuições, o destino dos recursos, a estrutura remuneratória dos funcionários e o nome dos dirigentes e membros do corpo técnico. 

Vista Panorâmica do SESC em Jundiaí

Em 2016, o TCU (Tribunal de Contas da União) alertou que nem todas elas entidades tinham sistema de auditoria (que confere a veracidade e qualidade das informações) interna e externa e que faltavam, em algumas delas, informações sobre o oferecimento de cursos gratuitos e detalhes sobre licitações. 

Aqui estão os relatórios de gestão mais recentes do Sesc, Sebrae, Senac, Sesi/Senai, Senar, Sescoop e Sest/Senat. 

GRATUIDADE 

Outro ponto que desperta críticas é o percentual de cursos gratuitos oferecidos pelas entidades. A cobrança de mensalidades afasta pessoas sem recursos que precisam se capacitar e coloca em xeque o interesse público que justifica o repasse de verbas ao sistema. 

Em 2009, após pressão do Ministério da Educação e embates com os empresários, o governo e as entidades firmaram um acordo estipulando percentuais mínimos de oferecimento de cursos gratuitos. 

Além disso, eles passaram a ter que obedecer a uma carga horária mínima, para impedir que fossem contabilizados capacitações de curtíssima duração em temas como reúso doméstico de cascas de frutas ou embalagem de presentes. 


Em setembro de 2015, o governo da então presidente Dilma Rousseff anunciou um pacote de corte de gastos e aumento de receitas para tentar equilibrar as contas públicas. Uma das medidas era reter 30% das verbas arrecadas para o Sistema S. 

Houve uma forte reação dos empresários, que controlam a gestão dessas entidades. O presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria), Robson Andrade, afirmou à época que a medida faria o sistema deixar de atender 1,2 milhão de alunos e 1,5 milhão de trabalhadores. 

Fachada do SESI em Alagoas

Dois meses depois, o governo desistiu da medida. Em troca, as entidades do Sistema S se comprometeram a oferecer mais vagas para o Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego) e de educação de jovens e adultos. 

Em outubro de 2016, o senador Ataídes de Oliveira apresentou um projeto de lei que destina 30% dos recursos arrecadados para as entidades do Sistema S à Seguridade Social. O projeto aguarda análise das comissões de Assuntos Sociais e de Assuntos Econômicos. A chance de aprovação é pequena, dado o forte lobby que as entidades exercem sobre deputados e senadores.
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Fonte: NEXO Jornal

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