sábado, 13 de maio de 2017

Por que não devemos celebrar o 13 de maio e a Lei Áurea que "aboliu" a escravidão



A historiografia oficial nos ensinou por décadas que 13 de maio era uma data para celebrar.

Naquele dia, em 1888, a generosa princesa Isabel, filha de Dom Pedro II, usou uma pena de ouro para assinar a abolição da escravidão do Brasil.

Pela visão eurocêntrica, difundida no ensino fundamental, nos livros em que você e eu estudamos, Isabel foi a heroína dos negros, discriminados, perseguidos, coisificados durante o Brasil colônia e império.

Bastou a rubrica real para a liberdade dos escravos ser alcançada no final do século 19.

Negros se humanizaram e passaram a ser livres e iguais aos brancos.



O Brasil foi o último país do Ocidente a libertar os escravos, e o ato benevolente da princesa foi, evidentemente, uma consequência histórica da decadência do regime escravocrata.

E a abolição resultou muito mais simbólica que concreta.

As causas do 13 de Maio

O império demorou bastante para oficializar o fim da escravatura.

Lá fora, a força-motriz do abolicionismo vinha da Inglaterra, que pretendia fomentar um mercado consumidor nas Américas - tendo em vista a crescente industrialização de sua produção.

Em 1845, os britânicos editaram a Lei Bill Aberdeen, que garantia a retenção dos navios transportando cativos da África rumo às Américas.

No Brasil, a Lei Eusébio de Queirós, que proibiu o tráfico de negros a partir de 1850, também atendia aos interesses dos ingleses.

Seguiram-se a ela a Lei do Ventre Livre, que concedia uma liberdade maquiada aos filhos de escravos, e a Lei dos Sexagenários, que libertava os escravos acima de 65 anos - se é que havia, nessa faixa etária, algum sobrevivente das condições desumanas das senzalas...

O cerco internacional à escravidão era apenas um dos ingredientes do caldeirão pró-abolição.

A força na formação de quilombos e a revolta dos negros contra as humilhações irracionais a que eram submetidos passou a esgotar os proprietários de terra.

A campanha abolicionista, liderada por intelectuais da época e por negros vitoriosos que participaram da Guerra do Paraguai (1864-1870), ganhava força ao passo que imigrantes europeus assalariados passavam a ser empregados nas lavouras.

Nesse cenário, não havia alternativa para Isabel que não conferir a liberdade aos negros.




As consequências do 13 de Maio

Como já tratei no texto Centenário de Abdias do Nascimento e a História que não aprendemos, a tal liberdade decretada pela Lei Áurea também foi para inglês ver. O império não adotou qualquer política pública para pretos e mulatos.

  • A princesa não executou reforma agrária pró-negros
Assim, escravos não podiam virar senhores de engenho ou mesmo donos da própria terra. Não poderiam produzir para si próprios nem fazer fortuna.
  • A princesa não se preocupou com a formação dos ex-escravos
Não houve incentivos à alfabetização e qualificação profissional dos ex-escravos.
Assim, não foi possível reduzir o fosso real de formação e condições de vida entre brancos livres e negros recém-libertos.
  • A princesa não formulou leis e políticas de promoção da igualdade racial
A escravidão só acabaria oficialmente se houvesse mecanismos e garantias para o tratamento igualitário de negros e brancos. Não só não houve, como a cultura escravocrata e racista no Brasil, já mais do que sacralizada à época, permitiu que a "liberdade" dos negros fosse uma nova prisão.
Pretos e mulatos foram direto para as ruas e favelas, engrossaram a massa de desempregados ou subempregados.

A fraude do 13 de Maio

O Movimento Negro Unificado (MNU), coletivo mais atuante na promoção da igualdade entre brancos e negros no decorrer do século 20, rechaçava a celebração do 13 de Maio como a data real da abolição da escravidão.

Como tentei defender neste artigo, o regime não foi desmontado pela princesa.

Pelo contrário, sem políticas públicas voltadas aos negros, a escravidão continuou.

Por isso, o MNU buscou celebrar as conquistas e vitórias do grupo com o Dia da Consciência Negra, em 20 de novembro.

A data marca a morte de Zumbi, esse, sim, um herói de verdade, líder do Quilombo dos Palmares, que buscava no século 17 resistir à exploração sanguinária de seus iguais de cor, pele e aparência.

Não é o 13 de Maio, mas o 20 de Novembro um dia para lembrarmos a História de uma luta de verdade, que ainda continua na segunda década do século 21.


Protesto contra o racismo em Copacabana







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