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domingo, 13 de junho de 2021

Brasil perde 24 árvores por segundo em 2020 enquanto alertas de desmatamento explodem

Texto de Regiane Oliveira (El País)
Vídeo de André Trigueiro (JN Globo) 


Entre meados de 2018 e o início de 2021, apenas 5% da área desmatada teve alguma ação do Ibama (multas ou embargos, por exemplo), um número que correspondeu a apenas 2% dos avisos de desmatamento em todo o país


O Ibama, órgão de fiscalização ambiental brasileiro, falhou em chegar a quase todos os alertas de desmatamento feitos pelos satélites que monitoram as áreas de floresta brasileira nos últimos anos. É o que apontam dados do Projeto MapBiomas, uma rede colaborativa de especialistas do país, que analisa estes alertas e acompanha o desmatamento, que vem aumentando no Brasil. 

Entre meados de 2018 e o início de 2021, apenas 5% da área desmatada teve alguma ação do Ibama (multas ou embargos, por exemplo), um número que correspondeu a apenas 2% dos avisos de desmatamento em todo o país. A organização estima ainda que 99% dos desmates feitos desde 2018 têm indícios ou evidências de ilegalidade ―não tem autorização, estão em áreas protegidas ou desrespeitam o Código Florestal. No ano passado, o desmatamento cresceu 13,6%, levando a uma perda média estimada de 3.795 hectares por dia, ou 24 árvores a cada segundo.



Os dados fazem parte de um relatório do órgão divulgado nesta sexta-feira, que mostra que o número de alertas de desmatamento explodiu em 2020: foram 74.218, um aumento de 30% em relação a 2019. Os desmatadores passaram a boiada por 13.853 km2 (1.385.300 hectares), uma área nove vezes maior que a cidade de São Paulo. “No dia mais crítico, 31 de julho, foram 4.968 hectares, quase 575m2 por segundo”, informa o MapBiomas, que foi criado no final de 2018 para facilitar a fiscalização remota dos desmates no Brasil, com base no processamento de alertas emitidos por cinco sistemas de monitoramento por satélite. Estas ferramentas fazem parte do arsenal à disposição do Ibama

Conforme dados do MapBiomas, a Amazônia representa quase 61% da área atingida pelo desmatamento, seguida pelo Cerrado, com 31%, Pantanal, 1,7%, e Pampa, 0,1%. Na Mata Atlântica (1,7% da área), o desmatamento cresceu substancialmente, com uma alta de 125%. Na Caatinga (4,4% da área), a primeira vista, o aumento foi expressivo (405%), no entanto, deve-se ao fato de que o bioma ganhou seu próprio sistema de detecção de desmate por satélite. Procurado na manhã desta sexta-feira, o Ibama ainda não respondeu aos questionamentos enviados pela reportagem.



Todas as unidades da federação tiveram alertas de desmatamento detectados em 2020, incluindo o Distrito Federal. O Estado do Pará lidera o ranking com 33% do número de alertas e 26,4% da área desmatada no país. Não à toa, é um dos Estados onde o Ibama teve uma melhor performance, cobrindo 8% da área desmatada e 1% dos alertas reportados. Segundo o relatório, não foram observados embargos ou autuações do Ibama entre 2019 e 2020 em nove Estados brasileiros. “Não há limite tecnológico, de informação ou de orçamento para a autuação remota hoje no Brasil. 

Na prática, se resume a vontade política”, afirma Tasso Azevedo, coordenador-geral da organização. “Mas significa que vai acabar o desmatamento se autuar todo mundo? Não, mas temos que diminuir a sensação de impunidade. Para isso, é preciso garantir que o desmatamento seja detectado e reportado e que os responsáveis sejam devidamente penalizados e não consigam aferir benefícios das áreas desmatadas”, afirma.

O Mato Grosso está no segundo lugar do ranking, com 5% dos alertas e 12,9% da área total desmatada. O relatório destaca, no entanto, que o Estado tem “um histórico de inovação na criação e implementação de instrumentos de combate ao desmatamento”, com a melhor base de dados disponíveis para consulta pública sobre desmatamento. No Mato Grosso, 47% dos alertas tiveram algum encaminhamento, como autuação ou embargo da terra. “Ainda assim, pouco mais da metade teve consequência. O ideal é que todos os alertas tenham alguma consequência”, afirma Azevedo. No terceiro lugar, figura o Maranhão, que dobrou a área desmatada, saltando da 6ª colocação, em 2019, para a 3ª posição dos que mais desmataram em 2020, com 12% da área desmatada no Brasil.

Segundo o relatório, do total de eventos de desmatamento, 13,2% cruzam com Unidades de Conservação (UC), 7,3% com Terras Indígenas (TI), 0,3% com territórios quilombolas, 30% com assentamentos rurais e 68,3% com áreas registradas no Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (Sicar) (68,3%). “Logo, em mais de dois terços dos casos, é possível saber quem é o responsável porque há registro”, afirma o Azevedo. 

Os dados do Sicar não são públicos, por isso a MapBiomas tem acesso apenas ao número de registro e não ao nome dos responsáveis pela terra. “O ideal é que fosse público, como o registro de imóveis”, afirma o coordenador da organização. Segundo ele, no entanto, os órgãos fiscalizadores sabem quem são os desmatadores. “A ideia é que a fiscalização remota funcione de modo automático, como uma multa de trânsito. Porque os relatórios vem com a imagem, como a foto do carro no momento em que você cruzou o farol vermelho. 

A multa e/ou embargo de terras para quem desmata deveria ser automático. Mas o próprio presidente do Ibama [Eduardo Fortunato Bim] não é a favor da autuação remota”, diz.

O Governo federal decidiu focar seus esforços contra o desmatamento em 11 cidades da Amazônia. Em fevereiro de 2021, o Conselho Nacional da Amazônia, cujo responsável é o vice-presidente general Hamilton Mourão, definiu onze municípios como prioritários para ações do Plano Amazônia 21/22, que substituirá a Operação Verde Brasil 2 na fiscalização e combate a crimes ambientais. 

“Levantamos que 70% do desmatamento, ou dos crimes ambientais, ocorrem em onze municípios que elencamos como área prioritária”, disse o vice-presidente à época. São eles: Itaituba, Rurópolis, Portel, Pacajá, São Félix do Xingu, Altamira e Novo Progresso no Estado do Pará, Apuí e Lábrea (AM), Porto Velho (RO) e Colniza (MT).

De acordo com a Mapbiomas, entre 210 e 2020, foram autuados ou embargados apenas 3% (616) dos 22.583 alertas detectados nesses municípios, o que representou 12% da área desmatada nesses territórios. Se considerados os 52 municípios prioritários do Ministério do Meio Ambiente, foram autuados ou embargados apenas 1.054 (2%) dos 53.750 alertas detectados entre 2019 e 2020, o que representou 9,3% da área desmatada. “Não é possível fiscalizar o país sem ser remotamente. Foram 74.218 alertas no ano passado, o que dá cerca de 205 eventos de desmatamento por dia. 

Numa operação presencial, é possível verificar dois, três alertas por dia. Se tivermos 10 operações paralelas, algo que não acontece, serão 30 análises por dia”, diz o coordenador do relatório, que afirma que o Ministério Público Federal tem utilizado de forma mais eficiente, desde 2017, dados do Projeto de Monitoramento do Desflorestamento na Amazônia Legal (Prodes/INPE) para instaurar ações civis públicas contra os responsáveis pelos desmatamentos ilegais, com mais de 60 hectares.



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