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quinta-feira, 21 de março de 2019

Carta da Juíza Kenarik Boujikian ao Presidente Lula

Por Kenarik Boujikian





“Caro Presidente Lula,

Bom dia!

Minha carta não chegará a tempo de ser entregue pelos amigos que estão em Curitiba, nesta data. Fiz uma confusão em razão do fuso-horário (estou muito longe, em Fiji). Mas, mesmo assim, resolvi escrever.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Moro é o alienista de Machado de Assis

Por Sidney Shalloub






Itaguahy é aqui e agora, diria talvez Machado de Assis, ao observar o ponto ao qual chegamos. Ao inventar Simão Bacamarte, o protagonista de “O alienista”, Machado mobilizou sem dúvida referências diversas, tanto literárias quanto políticas. Parece certo que se inspirou também em personagens históricas concretas, ou em situações de sua época que produziam tais personagens.

Na década de 1880, habitante da Corte imperial, ele assistia havia décadas à ciranda infindável de epidemias de febre amarela, varíola, cólera, etc. e a luta inglória dos governos contra tais flagelos.

O pior da experiência era que o fracasso contínuo das políticas de saúde pública, ou da higiene pública, como se dizia com mais frequência, provocava, paradoxalmente, o aumento do poder de médicos higienistas e engenheiros. Esses profissionais se encastelavam no poder público munidos da “ciência” e da técnica que poderiam renovar o espaço urbano de modo radical e “sanear” a sociedade.

Demoliam-se casas populares, expulsavam-se moradores de certas regiões, reprimiam-se modos de vida tradicionais, regulava-se muita cousa sob o manto do burocratismo cientificista. E as epidemias continuavam.

Machado de Assis refere-se a esse quadro como “despotismo científico”, em “O alienista” mesmo, ao descrever “o terror” que tomara conta de Itaguahy diante das ações de Bacamarte. Havia inspetor de higiene e engenheiro da fiscalização sanitária a agir com convicção de Messias, cheios de autoridade, inebriados de seus pequenos poderes.

Simão Bacamarte, portanto, é desenhado d’après nature, para usar a expressão daquele tempo meio afrancesado, por mais caricatural que a personagem possa parecer. A arte imita a vida, segundo Machado de Assis, quem sabe. A estória que contou é conhecida por todos, talvez uma das referências intelectuais clássicas mais compartilhadas nesta nossa república da bruzundanga.

Por isso é uma estória boa para pensar a nossa condição coletiva, Brasil, março de 2016. Bacamarte queria estabelecer de maneira objetiva e irrefutável os limites entre razão e loucura. Conseguiu amplos poderes da câmara municipal, dinheiro para construir a Casa Verde, seu hospício de alienados, e passou a atuar como que ungido por suas convicções científicas.

Ao contrário do que imaginara inicialmente, encontrou uma diversidade assombrosa de loucos. Se o eram mesmo, continuam conosco, como os impagáveis loucos “ferozes”, definidos apenas como sujeitos grotescos que se levavam muito a sério. A galeria de loucos que tinha a mania das grandezas é quiçá a mais relevante em nossa situação atual. Havia o cara que passava o dia narrando a própria genealogia para as paredes, aquele pé rapado que se imaginava mordomo do rei, e outro, chamado João de Deus, propalava que era o deus João.

O deus João prometia o reino do céu a quem o adorasse, e as penas do inferno aos outros. Ainda hoje em dia Simão Bacamarte acharia material humano de sobra para encher a Casa Verde. Se ampliasse a pesquisa para a internet, ele teria de investigar a hipótese de a loucura engolfar o planeta inteiro.

Afinal, segundo ele, “a razão é o perfeito equilíbrio de todas as faculdades; fora daí insânia, insânia, e só insânia”. Ou talvez não. Se Bacamarte lesse e visse a grande mídia brasileira, é possível que concebesse um conceito mais circunscrito de alienação mental. Sem a cacofonia virtual estaríamos expostos apenas à monomania de uns poucos, e a diversidade de opiniões é sacrossanta nesta nossa hora. Bendita internet.

O messianismo cientificista de Bacamarte se foi. Mas o curioso é que a ficção dele criou raízes na história brasileira, virou realidade. Muitos dentre nós, de cabelo bem grisalho ou até nem tanto, lembrarão da situação do país no final dos anos 1980 e no início da década seguinte, a viver a passagem sem ponte da ditadura para a hiperinflação.

Em retrospecto, penso que havia um quê de continuação da ditadura naqueles planos econômicos todos que produziram até uma nova caricatura de Messias, o caçador de Marajás. Agora a população não era mais culpada de viver na imundície e nos maus costumes, a causar epidemias de febre amarela.

No entanto, estava inoculada pelo vírus da cultura inflacionária. Daí vieram os czares da Economia ou ministros da Fazenda, ou que nome tivesse aquela desgraceira. As “autoridades” daquela ciência cabalística confiscavam poupança, congelavam preços, nomeavam “fiscais” populares dos abusos econômicos, podiam fazer o que lhes desse na veneta. Mas dava errado.

A inflação voltava, os caras não acertavam. Vinha outro plano, mais confisco, mais arrocho salarial, e nada. Viveu-se assim por uma década, ou mais. Cada ministro era um pequeno deus, cujo poder tinha relação direta com a sua profunda ignorância sobre o que fazer para dar jeito na bruzundanga.

Os higienistas do final do século XIX e os economistas do final do século XX tinham muito em comum. Em algum momento, o despotismo econômico se foi. Tinha de passar, passou. Tivemos democracia por algum tempo, com todos os seus rolos, mas sem salvadores da pátria, o que era um alívio. Livres, ainda que sob a batuta do deus Mercado, uma espécie de messianismo sem Messias, ou sem endereço conhecido.
Eis que surge, leve e fagueiro, o messianismo judiciário.

De onde menos se esperava, a cousa veio. Simão Bacamarte encarnou de novo, vive-se a história como a realização radical da ficção, hiper-ficção. As operações de despolitização do mundo são as mesmas –no despotismo científico do XIX, no despotismo econômico do XX, no despotismo judiciário do século XXI.

De repente, num processo que historiadores decerto explicarão no futuro, com a pachorra e a paciência daqueles que não vivem o presente às tontas, pois não sabem esquecer o passado, um determinado poder da república se emancipa dos outros, se desgarra, engole tudo à sua volta. Em nome da imparcialidade, da equidade, da prerrogativa do conhecimento (tudo igualzinho aos higienistas e aos economistas de outrora), eles provincializam a nação inteira, e negam, a cada passo, o que professam em suas perorações retóricas: agem de forma partidarizada, perseguem determinados indivíduos e organizações, transformam a sua profunda ignorância histórica num poder avassalador.

Todos sabemos como terminou a estória de Simão Bacamarte. Depois de testar tantas hipóteses, de achar que a loucura poderia quiçá abarcar a humanidade inteira, ele concluiu que o único exemplar da espécie em perfeito equilíbrio de suas faculdades mentais era ele próprio.

Por conseguinte, o anormal era ele, alienado só podia ser quem não tinha desequilíbrio algum em suas faculdades mentais. Bacamarte trancou-se na Casa Verde para pesquisar a si próprio e lá morreu alguns meses depois. Pode ser que haja aí um bom exemplo. Alguém saberia dizer, por favor, onde Machado de Assis deixou a chave da Casa Verde?

P.S. A semelhança entre Simão Bacamarte e um determinado juiz de província do Brasil atual me foi sugerida por um amigo aqui de Harvard, a quem agradeço pela inspiração. Obrigado a todos aqueles que saíram às ruas, neste 18 de março, em defesa da democracia.
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Sidney Chalhoub foi professor de História da UNICAMP, atualmente é professor da HARVARD, lecionando história da América Latina e do Caribe. 

sábado, 20 de fevereiro de 2016

A Justiça é Cega ou deveria ser?

Por Paulo Franco 

A 2ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Paraná, sentenciou um funcionário demitido por um empresa do Vale do Itajai, a pagar R$ 3.000,00 por danos morais ao patrão.


Sérgio Moro e demais juízes que usam a opinião pública e a força das instituições alheias ao judiciário, para sustentar suas sentenças, deveriam mirar-se no exemplo abaixo.

A 2ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Paraná, sentenciou um funcionário demitido por um empresa do Vale do Itajai, a pagar R$ 3.000,00 por danos morais ao patrão. O funcionário havia ofendido o patrão por mais de uma vez.


A frase "A justiça é cega", é uma máxima que não significa que a justiça não enxerga o que deveria enxergar.  Mas exatamente o contrário, ela não deve enxergar o que não deve enxergar, para enxergar somente o que deve ser enxergado. 

Então, ela deve ser cega para tudo aquilo que impede que a justiça seja plenamente justa, se o réu ou a vítima é pobre ou rico, negro ou branco, católico ou ateu, comunista o fascista. Também deve ser cega para a opinião pública, para o poder econômico, para o poder político, para o poder da Imprensa. 

A justiça é cega para tudo que não seja exatamente o que esteja envolvido nos autos do processo, o crime cometido, as provas coletadas que devem ser objetivas, concretas, irrefutáveis, os princípios do direito brasileiro, a presunção da inocência, o direito ao contraditória, o respeito ao devido processo penal, etc etc.
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Postagens Relacionadas:
Embargos Infringentes: O voto (histórico) do Decano Celso de Mello 
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Os olhos da justiça devem estar bem aberto e concentrados nos autos e fechados para tudo o mais.  O pedido de apoio à opinião pública e à sociedade civil organização (instituições) vai contra a essência da atividade jurisdicional, da atividade da magistratura, que é julgar com total independência de forças e fatores exógenos aos autos do processo.

Lembremos um trecho essencial e extremamente importante do decano Celso de Mello, por ocasião do julgamento da admissibilidade do recurso jurídico denominado "embargos infringentes".
"Se é certo, portanto, Senhor Presidente, que esta Suprema Corte constitui, por excelência, um espaço de proteção e defesa das liberdades fundamentais, não é menos exato que os julgamentos do Supremo Tribunal Federal, para que sejam IMPARCIAIS, ISENTOS e INDEPENDENTES, NÃO PODEM EXPOR-SE A PRESSÕES EXTERNAS, como aquelas resultantes do clamor popular e da pressão das multidões, sob pena de completa subversão do regime constitucional dos direitos e garantias individuais e de aniquilação de inestimáveis prerrogativas essenciais que a ordem jurídica assegura a qualquer réu mediante instauração, em juízo, do devido processo penal." (Min. Celso de Mello)
Diante disso, podemos entender com muita clareza e serenidade o quando essa fala do Juiz Federal Sergio Moro é uma heresia, uma aberração à conduta de um Magistrado.  Isso depõe contra a sua


Muitos casos e posturas contraditórias tem estimulado a falta de confiança e credibilidade no judiciário brasileiro, levando a críticas questionamentos com ditos populares do tipo "2 pesos e 2 medidas" ou ainda "pau que bate em Chico não bate em Francisco?"

Dentre os inúmeros casos questionáveis, só para ilustração, destaco 3 casos: (i) A diferença descomunal do tratamento judicial para os dois Mensalões, o tucano e o petista. (ii) A prisão de Marice Corrêa Lima, cunhada de João Vaccari, vis a vis a NÃO prisão de Claudia Cruz e Danielle Cunha, esposa e filha de Eduardo Cunha. (iii) A prisão instantânea do senador Delcídio do Amaral e a NÃO prisão de Deputado Federal Eduardo Cunha.

 

O que eu e, certamente, a grande maioria dos brasileiros gostaria de ver é uma justiça cega.  Cega de verdade, ou seja na atuação das Polícias Militares, Ministérios Públicos Estaduais, Judiciários Estaduais, Polícia Federal,  Ministério Público Federal, Judiciário Federal, Tribunais Superiores de Justiça, Procuradoria Geral da República e Supremo Tribunal Federal Justiças Federais. O Poder Judiciário deve muito ao Brasil, demonstrando atraso operacional e civilizatório e também, comprometimento com classes sociais e políticas.


Referências: Empório do Direito

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

A chegada de Yoani em Coité e o papel do Juiz de Direito

Crônica por Gerivaldo Neiva *


Para quem ainda não conhece, Yoani Sánchez é cubana, apresentada por boa parte da mídia mundial como sendo uma blogueira que rompeu as barreiras da censura em Cuba e faz oposição ao regime. Pois bem, esta moça está visitando o Brasil, depois de várias tentativas de sair da Ilha, e resolveu aceitar o convite para palestrar em Conceição do Coité-Ba, comarca da qual sou o Juiz de Direito.
Sabendo da visita, os estudantes da cidade e políticos de esquerda começaram a se organizar para impedir a entrada da moça na cidade e também impedir a realização do evento. Em seguida, fui procurado pelos organizadores do evento, acompanhado de dois bons advogados, para garantir que sua convidada pudesse entrar em Coité e realizar a palestra.
Primeiro, tentei mediar um diálogo entre os estudantes e os organizadores do evento, mas não obtive êxito. Os primeiros estavam irredutíveis e não admitiam de forma alguma a presença da moça cubana em terras coiteenses e os segundos não abriam mão de realizar o evento, pois contavam com a presença de políticos famosos e convidados de toda a região.
Diante do impasse, convidei o comandante local da polícia militar e lhe determinei que garantisse, sem violências ou repressão, a realização dos dois eventos. Primeiro, preparasse uma escolta desde a entrada da cidade e conduzisse a moça cubana por onde pretendesse circular na cidade, garantindo-lhe a integridade física. Segundo, preparasse uma boa guarnição para garantir a realização do protesto dos estudantes, mesmo barulhenta, desde que não impedisse a realização da palestra. Enfim, comandante, seu papel é garantir a realização da palestra e também do protesto dos estudantes.
E decidi assim com a Constituição aberta sobre minha mesa de trabalho. O Brasil é um “Estado Democrático destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias”,conforme, escrito em seu preâmbulo; o Estado brasileiro tem como fundamentos a cidadania, a dignidade da pessoa humana e o pluralismo político (art. 1o) e, por fim, é livre a manifestação do pensamento, a liberdade de consciência, a expressão da atividade intelectual e de reunião, dentre outras garantias previstas no artigo 5o da Constituição.
Pois bem, decidindo assim, a moça chegou à cidade sob vaias e protestos, mas teve garantido o seu direito de locomover-se em território nacional e expressar seu pensamento. Da mesma forma, garantiu-se o mesmo aos contrários ao seu pensamento.